sexta-feira, 24 de abril de 2015

Escola Cidadã no Século 21

EXPOSIÇÃO DE MOTIVOS - PROC. Nº 01005/15 - PLL 083/15

A Constituição Federal de 1988 consagrou inúmeras conquistas sociais. Na área da educação vários princípios foram inscritos, tais como a concepção de educação como direito de todos, a gestão democrática, a igualdade de condições para o acesso e a permanência na escola, a gratuidade do ensino público, a valorização dos profissionais, a garantia de padrão de qualidade, entre outros. A partir de então os estados e municípios ampliaram o acesso à educação o que possibilitou a melhoria considerável nos índices de acesso, permanência e redução do analfabetismo.
Por sua vez a Lei de Diretrizes e Bases (LDB), aprovada em 1996, reafirmou os preceitos constitucionais e no art. 4º, inciso IX, estabeleceu que o Estado tem o dever de garantir “padrões mínimos de qualidade de ensino definido como a variedade e quantidade mínimas, por aluno, de insumos indispensáveis ao desenvolvimento do processo ensino-aprendizagem".
Devido enorme desigualdade educacional nossas crianças e adolescentes enfrentam situações de carências múltiplas e o acesso à escola é uma forma de minimizar as iniquidades. É forçoso reconhecer que a ampliação do acesso ocorreu numa escola sem estrutura adequada para acolher um contingente expressivo e heterogêneo de crianças e adolescentes e que o alcance uma educação de qualidade precisa de uma escola pública com uma estrutura física e material em condições compatíveis à contemporaneidade.
O Ministério da Educação em um documento intitulado Padrões Mínimos de Funcionamento da Escola de Ensino Fundamental (2002, p. 69) reconhece que “a partir de um dado momento, as construções escolares sofreram sério rebaixamento em seu padrão”.
A justificativa contida na Resolução nº 012 do CME/POA (2013) é muito esclarecedora, diz que
Historicamente a busca por soluções para que novas turmas fossem atendidas fez com que espaços como bibliotecas, refeitórios, depósitos, salas dos serviços pedagógicos, salas de artes e laboratórios, dentre outros, fossem transformados em “salas de aula”, quando isso não ocorria com jardins ou quadras esportivas que abrigavam a construção de “puxadinhos” para atender mais alunos. A utilização deste padrão de procedimento resultou em produção de precariedade, transformando-se em uma marca da atuação do estado brasileiro no campo educacional. E hoje, ao mesmo tempo em que se constroem prédios modernos, com amplos recursos, seguem existindo os chamados “puxadinhos. (CME, 2013,p.7-8)

O Plano Nacional de Educação, lei nº 10.172, de 2001, nos objetivos e metas de cada etapa da educação básica determinou a elaboração dos padrões mínimos de infraestrutura para o funcionamento adequado das instituições de educação infantil, ensino fundamental e ensino médio e especificou alguns itens.
O MEC elaborou documentos que definem os insumos que devem ser considerados no estabelecimento dos padrões mínimosde funcionamento da escola de ensino fundamental (2002) e da educação infantil (2006).
Há documentos legais que tratam de infraestrutura física das escolas e estabelecem alguns critérios.Em Porto Alegre, o Código de Edificações, lei nº 284/1992 traz no capítulo II – Edificações Não Residenciais -, uma seção dedicada às escolas, mas trata apenas de proporções das instalações sanitárias e a relação com o número de alunos e para o acesso para portadores de deficiência física às dependências (art. 141); de metragens para os locais de recreação cobertos e descobertos em relação à área das salas de aula (art. 142) e tamanho das salas de aula na relação com o número de alunos (art. 144). Também a Resolução nº  12, de 2013, do Conselho Municipal de Porto Alegre – CME/POA -, estabelece normas para a criação de escolas públicas do sistema municipal de educação. No art. 4º, determina que “A criação de escolas pressupõe o planejamento de edificações cujos projetos arquitetônicos considerem primeiramente a finalidade a que se destinam e estejam em consonância com princípios da arquitetura sustentável” e prevê oito itens que devem ser atendidos, que são: “Aproveitamento da água; Conforto visual; Eficiência Energética; Conforto Acústico; Conforto Térmico; Infraestrutura para Tecnologia de Informação e Comunicação; Infraestrutura adequada para o planejamento e a realização da ação educativa; Normas de Acessibilidade.
Mas a legislação que aborda as questões referentes à estrutura física escolar,especialmente para as escolas existentes,ainda é insuficiente e precisa avançar rumo a um plano de necessidades das escolas.
Encontramos na história da educação autores como Freinet, Decroly, Montessori, Anísio Teixeira, Darcy Ribeiro, entre outros, que se dedicaram a refletir sobre o espaço que favorece a aprendizagem, pois no seu entender o espaço escolar em si educa, ele é um elemento do currículo oculto. Na arquitetura escolar, na decoração exterior e interior, nas áreas de recreação, entre outros, está representada a dimensão simbólica e pedagógica que as crianças e adolescentes internalizam e aprendem. Também na estrutura escolar está estampada a importância que os poderes constituídos atribuem à educação e a preocupação com sua qualidade.
No Brasil, encontramos várias escolas construídas num padrão arquitetônico projetado para favorecer o processo de ensino aprendizagem, tais como: o Centro Educacional Carneiro Ribeiro - Escola Parque da Bahia -, nos anos 1950; a Escola Parque de Brasília, nos anos 1960;  os Centros Integrados de Educação Pública (CIEPs) no Rio de Janeiro e no Rio Grande do Sul e os Centros Integrados de Educação Municipal (CIEMs) em Porto Alegre, nos anos 1980/1990; as escolas construtivistas em Porto Alegre, nos anos 1990, entre outras.
Especialistas também alertam para a interferência do ambiente na qualidade do aprendizado e da saúde dos estudantes. Por ser o espaço no qual se opera um processo formativo, a escola precisa de condições adequadas de infraestrutura, conforto ambiental, pois é no ambiente escolar que ocorre a maior parte do convívio social e de lazer das crianças e dos adolescentes. É ali que elas buscam integrar-se com as pessoas a sua volta, o que numa concepção interacionista nos permite afirmar que o ambiente escolar influi sobremaneira no desenvolvimento de suas capacidades: cognitivas, emocionais, atitudinais. Nesse sentido, é inegável que a estrutura escolar, configura-se como elemento importante para a formação do ser humano, mesmo de forma não-verbal, tem impacto direto e simbólico sobre os estudantes, facilitando ou dificultando as aprendizagens e os comportamentos. Há uma interação entre o espaço físico, as atividades pedagógicas e o comportamento humano. Por isso, a escola tem que ser um espaço atrativo e aconchegante para os estudantes. Os equipamentos pedagógicos como playground, quadra e ginásio de esportes, entre outros, que para muitos pode parecer supérfluo, são essenciais para garantir que estudantes passem quatro ou sete horas por dia em um ambiente estimulante. Outros aspectos como carteiras e quadros adequados, tamanho da sala de aula, infraestrutura para implementação de equipamentos tecnológicos são importantes para que a escola se torne um ambiente propício à aprendizagem.
Além das edificações, os espaços escolares precisam dispor de área de convivência e recreação que tenha vegetação e, de preferência, um bom projeto paisagístico. Especialmente na educação infantil as áreas livres (espaçosas com partes ensolaradas e outras sombreadas) são indispensáveis para o desenvolvimento da psicomotricidade (correr, pular, exercitar-se) das crianças, para a participação em jogos ativos e para ter um maior contato com a natureza.
O conhecimento empírico sobre as escolas, vivências e/ou pesquisas e as inúmeras reportagens veiculadas na mídia, nos permite afirmar que grande parte das escolas públicas apresenta uma série de problemas ligados à infraestrutura, tais como: problemas relacionados à acústica(a intensidade de ruídos influencia na atenção dos estudantes e podem causar problemas auditivos), à luminosidade(baixos níveis de iluminação artificial e/ou incidência inadequada da luz natural no quadro, insolação direta sobre os alunos em sala de aula) e ao conforto térmico (ambiente abafado, muito frio ou muito quente pode fazer com que o aluno fique desatento).É importante lembrar que, devido aos efeitos do aquecimento global, a temperatura está mais alta isso implica na necessidade da escola contemporânea dispor de climatização. Também, apresenta inexistência de áreas livres ensolaradas e de paisagismo; inexistência ou precariedade de salas de multimeios e de rede lógica de conectividade; construção sem previsão para futuras ampliações; segurança (abertura de portas voltadas para fora e outras questões voltadas à prevenção de incêndio); problemas relacionados às modificações de uso e do desgaste natural de uma construção, entre outros.
A questão estética também é um item a ser observado quando se trata de estrutura física adequada. Porém, não raras vezes as escolas são espaços sem nenhuma beleza, sem contar que muitas vezes são sujos, cheio de mato, portas que não fecham, janelas que não abrem,vidros e banheiros quebrados e mal-cheirosos;quadros-verde quebrados e riscados e, também, ventiladores quebrados, quando há,área para brincadeiras totalmente impermeabilizada, não sombreada e sem vegetação.
A falta de estrutura física agradável e adequada e manutenção dificultam o trabalho docente e desanima os professores e as professoras no desempenho de sua tarefa pedagógica. Em geral as escolas antigas tendem a apresentar mais problemas estruturais e de conforto ambiental além do que as edificações escolares ficam obsoletas e exigem reciclagem para atingir níveis favoráveis de conforto ambiental. A justificativa da Resolução nº 12 do CME/POA (2013, p. 8) corrobora as afirmações acima ao dizer que estudos: “[...] apontam que a maior parte das edificações escolares possuem condições ambientais inferiores às desejadas [...] referentes aos seguintes aspectos: condições de conforto térmico e à funcionalidade; lotação excessiva nas salas de aula; falta de ambientes específicos para atividades como laboratórios, bibliotecas e salas de vídeo, música [...]”.
Outro elemento que precisa ser considerado quando se aborda as condições mínimas de qualidade de infraestrutura e de conforto ambiental é a ampliação da jornada escolar. A LDB, no seu art. 34, §2º, determina que o ensino fundamental, progressivamente, deve ser ministrado em tempo integral. Nos dias de hoje, por várias razões, essa questão está cada vez mais sendo pautada. Algumas são de ordem funcional, como a necessidade das mães de deixar seus filhos em lugar seguro para poderem trabalhar. Mas, as razões principais vão ao encontro do direito das crianças e adolescentes à uma educação de qualidade. Trata-se de pensar uma proposta pedagógica que se paute por uma concepção de educação integral, o que para isso é necessária a ampliação da jornada escolar diária. O fato é que, com a universalização do acesso ao ensino fundamental, com a melhoria no fluxo escolar e com a redução da natalidade e de matrículas, a tendência é que haja escolas com espaços ociosos o que se configura num cenário propício à jornada em tempo integral, mas que certamente as escolas precisam de adequações.
Nos últimos tempos “O conceito de construção sustentável ganha espaço nos projetos e construções [de escolas], em todo o país” (CME, 2013, p.9), pois a preocupação com o uso ecológico do espaço da escola não pode restringir-se à área livre disponível, a existência de vegetação, a coleta seletiva de lixo. Portanto, há que se pensar em reciclagens que propiciem eficiência energética, redução de consumo de água, enfim ambientes sustentáveis.
É importante ressaltar que a Lei nº 13.005, de 25 de junho de 2014, que aprovou o Plano Nacional de Educação, na meta nº20, determina que o “investimento público em educação pública seja ampliado de forma a atingir, no mínimo, o patamar de 7% (sete por cento) do Produto Interno Bruto - PIB do País no 5o (quinto) ano de vigência da Lei e, no mínimo, o equivalente a 10% (dez por cento) do PIB ao final do decênio”.
Nesse sentido, esse Projeto de Lei busca avançar na legislação especificando as condições mínimas de infraestrutura, de conforto ambiental, de sustentabilidade e de segurança para as escolas públicas existentes e para a construção de escola públicas novas no município de Porto Alegre, condições fundamentais para que se consiga uma educação de qualidade.


VEREADORA SOFIA CAVEDON


PROJETO DE LEI

Estabelece Condições Mínimas de Qualidade de Infraestrutura, Conforto Ambiental, Sustentabilidade e Segurança para as Escolas – Estabelecimentos de educação infantil e ensino fundamental e médio no Município de Porto Alegre. 

Art. 1º Ficam definidas as condições mínimas de qualidade de infraestrutura, de conforto ambiental, segurança e sustentabilidade para os projetos arquitetônicos de construção de escola nova e readequação das escolas de educação infantil, ensino fundamental e médio situadas no município de Porto Alegre.

Parágrafo Único.Conforto ambiental refere-se às condições higrotérmicas, luminosas, visuais, acústicas e estéticas do espaço escolar, fator determinante para a saúde dos usuários e decisivo para o desenvolvimento dos processos de ensino e aprendizagem.
Art. 2º São condições mínimas de qualidade referentes à infraestrutura do espaço escolar, que atendem ao artigo1º, os itens relacionados abaixo:
I - Espaço interno com iluminação, insolação, ventilação, visão para o espaço externo, rede elétrica e segurança, água potável, esgotamento sanitário, temperatura ambiente;
II - Instalações sanitárias e condições para a manutenção da higiene em todos os edifícios;
III- Ambiente interno e externo para o desenvolvimento das atividades da educação infantil, incluindo o repouso, a expressão livre, o movimento e o brinquedo;
IV - Adaptação dos edifícios escolares e áreas da escola às normas de acessibilidade universal, incluindo pisos táteis no acesso às dependências da escola;
V - Pisos permeáveis nas áreas de circulação da escola – calçadas e passarelas;
VI- Instalações elétricas de acordo com a capacidade de carga de entrada da escola com adequação da caixa de distribuição por carga, em rede própria que alimenta aparelhos de grande consumo (ar condicionado, chuveiros) e rede geral de iluminação;
VII - Instalações hidráulicas dimensionadas para as atividades da escola e aquecedores para atendimento das pias da cozinha, lavatório e chuveiro dos funcionários;
VIII- Infraestrutura para Tecnologia de Informação e Comunicação com ambiente wireless em todas as salas de aula, dotando a escola com pontos de internet;
IX – Infraestrutura para salas ambientes de acordo com o Projeto Político Pedagógico da escola;
X- Infraestrutura adaptável à realização da ação educativa;
Art. 3º São condições mínimas de qualidade referentes ao conforto ambiental e à sustentabilidade do espaço escolar, que atendem ao artigo 1º, os itens relacionados abaixo:
I - Conforto luminoso e visual (harmonia entre iluminação natural e artificial) em todas as dependências da escola, especialmente, nas salas de aula;
II - Conforto acústico, especialmente, no auditório e em todas as salas de aula;
III - Conforto higrotérmico. Dotar a escola de aparelhos de ar condicionado – quente e frio – especialmente, nas salas administrativas e em todas as salas de aula;
IV – Conforto estético e valorização do ambiente natural;
V– Paisagismo (jardim, horta e/ou pomar), planejado para atender esteticamente o ambiente escolar e contribuir no conforto térmico, acústico e visual, inclui espaço de jardim, grama e acessos pavimentados e propicie práticas de educação ambiental;
VI – Eficiência hídrica, aproveitamento da água através de cisterna e água de vertentes, valorizando espaços alternativos e naturais de uso de água, possibilitando armazenamento para uso em sanitários, lavagens e irrigação;
VII - Eficiência energética e busca de fontes naturais e/ou alternativas de energia.
Art. 4º São condições mínimas de qualidade referentes à segurança do espaço escolar, que atendem ao artigo 1º, os itens relacionados abaixo:
I - Plano de Prevenção e Proteção Contra Incêndio (PPCI) completo;
II - Cercamento e iluminação adequadas à segurança da comunidade e do patrimônio, com pavimentação e arborização das calçadas públicas do entorno;
III - Monitoramento eletrônico através de sistema de câmeras de vídeo nos ambientes externos e de circulação da escola e sistemas de alarme monitorado.
Art. 5º São espaços escolares necessários, além dos convencionais, considerando a etapa da educação básica a que se destinam, os itens relacionados abaixo:
I - Espaços para esporte e recreação adequados para cada tipologia de escola;
II – Ginásio e/ou quadra poliesportiva coberta para prática de esportes, com vestiários e sala multiuso, adequados para cada tipologia de escola;
III - Instalação para laboratórios, de Ciências, Artes, e sala de multimeios;
IV – Biblioteca com espaço adequado para contação de histórias e trabalho individual e com acervo atualizado;
V - Cozinha e refeitório dimensionados para o padrão de funcionamento da escola;
VI- Sala de estudos para docentes – construção nova ou adaptação -, uma sala para os professores e professoras, como espaço para elaborar estudos e planejamentos das atividades docentes na escola;
VII - Auditório, com recursos multimeios e espaço de guarda de equipamentos;

Art. 6º As escolas de tempo integral devem contar com espaços de convivência.

Art. 7º Na construção de novas escolas, readequação e/ou reforma das escolas existentes não deverão ser usados materiais com efeito carcinogênico, mutagênico ou com atuação como disruptores endócrinos.

Art. 8º As escolas existentes devem progressivamente adequar-se às condições de infraestrutura e de conforto ambiental definidas nesta lei.

Parágrafo Único Toda e qualquer reforma de escola deve buscar atender os requisitos estabelecidos nesta lei.

Art. 9º Para a adequação e/ou reforma das escolas existentes,bem como a construção de escolas novas,são necessários o projeto arquitetônico e parecer técnico que devem ser precedidos de discussão com a comunidade escolar.

Parágrafo Único Após a elaboração do projeto arquitetônico, uma cópia deverá ser entregue à direção e ao Conselho Escolar para o monitoramento da execução da obra.
Art. 10 A construção de escolas, readequação e/ou reforma das escolas existentes deve contemplar os princípios da flexibilidade, para acolher novas tipologias de espaço educativo de acordo com o Projeto Político Pedagógico de cada escola.

Art. 11 A observância das condições definidas nesta lei levará em conta a etapa da educação básica a que se destina o espaço escolar.


Art. 12 Esta Lei entra em vigor na data de sua publicação.

Vereadora Sofia Cavedon
 

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