Em 2013 novos governos assumem em
todas as cidades do país. Se engana quem acha que seus destinos são individuais
e atomizados, que as eleições respondem a processos específicos e autônomos.
Entender o fenômeno que muitas vivem e o processo em que estão inseridas, nos
faz com mais condições de interferir na qualidade de vida dos brasileiros.
É nas cidades que se revelam fenômenos
como o chamado “gentrificação” ou instalação do modelo cidades-empresas
americano – embalado agora pelo grande negócio “Copa do Mundo”, contratado com
os países, com regras que se sobrepõem à soberania nacional. Trata-se do “aburguesamento” de áreas centrais das grandes
metrópoles que são tradicionalmente ocupadas pelos pobres, com a consequente
expulsão dessas populações mais carentes, resultando na valorização imobiliária
desses espaços.
De caráter excludente e
privatizador, este
processo combina farta distribuição do direito de construir mais nas áreas mais
nobres com a segregação dos pobres nas áreas mais longínquas, carentes de
infraestrutura, de serviços públicos, de acesso à renda. Leis encaminhadas por estes gestores são apoiadas nos
parlamentos, e promovem estes incentivos, quase sempre impermeáveis a qualquer
mecanismo de garantia de retorno ao interesse público geral ou mesmo
contrapartidas mitigadoras dos impactos urbanos. Estes todos, via de regra, tem
ficado para o estado, em nome do “consenso do desenvolvimento”.
Associados aos
políticos, ao grande capital e aos promotores culturais, os planejadores
urbanos, agora planejadores-empreendedores, tornaram-se peças-chave dessa
dinâmica - analisa Otília Arantes, em A Cidade do Pensamento Único:
Desmanchando Consensos.
Mecanismos de
aligeiramento e flexibilização como comissões, secretarias e escritórios
específicos compostos quase que exclusivamente de cargos políticos, foram
criados para “desburocratizar” ainda mais as obras da cidade, baseados no
“consenso” criado em torno do crescimento a qualquer preço pela aliança entre
os gestores e as incorporadoras, os corretores, banqueiros e os chamados por
Harvey de “coadjuvantes igualmente interessados e poderosos”: a mídia, as
empresas esportivas, universidades, os políticos, as câmaras de comércio, etc.
Para David Harvey, “uma
nova e radical elite financeira toma conta das cidades liderando uma coalizão pró-crescimento que
habilmente manipula o apoio público e combina fundos públicos e privados para
promover uma urbanização comercial em larga escala”.
No pleito municipal
recente, pudemos constatar, em especial nas grandes cidades, que os
beneficiados e interessados nesta política financiam larga e generosamente seus
representantes nas disputas eleitorais, favorecidos pelo sistema político
eleitoral brasileiro de financiamento privado das campanhas – e consolidam,
através de campanhas milionárias, da contratação de exímios marqueteiros,
através de alargadas coalisões que diluem os verdadeiros interesses dos
partidos, sua influência nas políticas públicas.
Um dos indicadores de que esta
lógica é degradadora para todos, é a escalada da violência, que contrasta com
um país que avança na inclusão social e espalha esperança de futuro. Os valores
de consumo, de competição e de individualismo, da meritocracia, vendidos como
condição de sucesso, não são suficientes para os banidos das benesses desses
negócios. Temidos como ratos, se organizam para assaltarem as “despensas
fartas” exibidas sem pudor nas telas de TV que chegam nos mais miseráveis
casebres! E milhares destes coexistem com os grandes projetos do chamado
“desenvolvimento”, pelo apelo da dita “modernização” e de entretenimento –
atual culturalismo de mercado -
financiados por fundos públicos, alavancados pela iniciativa privada. É
emblemática disto, a paisagem do entorno do complexo Arena do Grêmio Futebol Porto Alegrense onde
a falta de esgotamento sanitário, energia elétrica e água potável, moradias
dignas e saúde atinge mais de duas mil pessoas. É emblemático também por
tratar-se de investimento no “espetáculo urbano” que, segundo David Harvey, substitui o espetáculo como forma de
resistência ou de festa popular revolucionária pelo espetáculo como forma de
controle social.
Movimentos urbanos de reação
organizam-se por todo o país, buscando dar
visibilidade a esta opção que abandona cruelmente o atendimento das condições
básicas de vida digna para todos, criar consciência do processo em curso,
empoderar a cidadania, apoiar a resistência: os Comitês Populares da Copa, os
Movimentos Ambientalistas, os Fórum de Reforma Urbana, o emblemático Movimento
em Defesa da Alegria Pública em Porto Alegre. Conforma-se uma aliança desde os
bairros populares à classe média critica que percebem o destino nefasto de uma
cidade que não consegue construir paz e sustentabilidade, fruição e fluidez, se
continuar sendo um grande negócio a serviço da acumulação de riquezas e
privilégios.
Sofia Cavedon - Vereadora PT-PoA