quarta-feira, 26 de dezembro de 2012

Do destino das cidades e da cidadania

Em 2013 novos governos assumem em todas as cidades do país. Se engana quem acha que seus destinos são individuais e atomizados, que as eleições respondem a processos específicos e autônomos. Entender o fenômeno que muitas vivem e o processo em que estão inseridas, nos faz com mais condições de interferir na qualidade de vida dos brasileiros.
           
É nas cidades que se revelam fenômenos como o chamado “gentrificação” ou instalação do modelo cidades-empresas americano – embalado agora pelo grande negócio “Copa do Mundo”, contratado com os países, com regras que se sobrepõem à soberania nacional. Trata-se do “aburguesamento” de áreas centrais das grandes metrópoles que são tradicionalmente ocupadas pelos pobres, com a consequente expulsão dessas populações mais carentes, resultando na valorização imobiliária desses espaços.
           
De caráter excludente e privatizador, este processo combina farta distribuição do direito de construir mais nas áreas mais nobres com a segregação dos pobres nas áreas mais longínquas, carentes de infraestrutura, de serviços públicos, de acesso à renda. Leis encaminhadas por estes gestores são apoiadas nos parlamentos, e promovem estes incentivos, quase sempre impermeáveis a qualquer mecanismo de garantia de retorno ao interesse público geral ou mesmo contrapartidas mitigadoras dos impactos urbanos. Estes todos, via de regra, tem ficado para o estado, em nome do “consenso do desenvolvimento”.
           
Associados aos políticos, ao grande capital e aos promotores culturais, os planejadores urbanos, agora planejadores-empreendedores, tornaram-se peças-chave dessa dinâmica - analisa Otília Arantes, em A Cidade do Pensamento Único: Desmanchando Consensos.
           
Mecanismos de aligeiramento e flexibilização como comissões, secretarias e escritórios específicos compostos quase que exclusivamente de cargos políticos, foram criados para “desburocratizar” ainda mais as obras da cidade, baseados no “consenso” criado em torno do crescimento a qualquer preço pela aliança entre os gestores e as incorporadoras, os corretores, banqueiros e os chamados por Harvey de “coadjuvantes igualmente interessados e poderosos”: a mídia, as empresas esportivas, universidades, os políticos, as câmaras de comércio, etc.         
           
Para David Harvey, “uma nova e radical elite financeira toma conta das cidades  liderando uma coalizão pró-crescimento que habilmente manipula o apoio público e combina fundos públicos e privados para promover uma urbanização comercial em larga escala”. 

No pleito municipal recente, pudemos constatar, em especial nas grandes cidades, que os beneficiados e interessados nesta política financiam larga e generosamente seus representantes nas disputas eleitorais, favorecidos pelo sistema político eleitoral brasileiro de financiamento privado das campanhas – e consolidam, através de campanhas milionárias, da contratação de exímios marqueteiros, através de alargadas coalisões que diluem os verdadeiros interesses dos partidos, sua influência nas políticas públicas.          

Um dos indicadores de que esta lógica é degradadora para todos, é a escalada da violência, que contrasta com um país que avança na inclusão social e espalha esperança de futuro. Os valores de consumo, de competição e de individualismo, da meritocracia, vendidos como condição de sucesso, não são suficientes para os banidos das benesses desses negócios. Temidos como ratos, se organizam para assaltarem as “despensas fartas” exibidas sem pudor nas telas de TV que chegam nos mais miseráveis casebres! E milhares destes coexistem com os grandes projetos do chamado “desenvolvimento”, pelo apelo da dita “modernização” e de entretenimento – atual culturalismo de mercado -  financiados por fundos públicos, alavancados pela iniciativa privada. É emblemática disto, a paisagem do entorno do complexo  Arena do Grêmio Futebol Porto Alegrense onde a falta de esgotamento sanitário, energia elétrica e água potável, moradias dignas e saúde atinge mais de duas mil pessoas. É emblemático também por tratar-se de investimento no “espetáculo urbano” que, segundo David  Harvey, substitui o espetáculo como forma de resistência ou de festa popular revolucionária pelo espetáculo como forma de controle social.


Movimentos urbanos de reação organizam-se por todo o país, buscando dar visibilidade a esta opção que abandona cruelmente o atendimento das condições básicas de vida digna para todos, criar consciência do processo em curso, empoderar a cidadania, apoiar a resistência: os Comitês Populares da Copa, os Movimentos Ambientalistas, os Fórum de Reforma Urbana, o emblemático Movimento em Defesa da Alegria Pública em Porto Alegre. Conforma-se uma aliança desde os bairros populares à classe média critica que percebem o destino nefasto de uma cidade que não consegue construir paz e sustentabilidade, fruição e fluidez, se continuar sendo um grande negócio a serviço da acumulação de riquezas e privilégios.

Sofia Cavedon - Vereadora PT-PoA

Nenhum comentário:

Postar um comentário