domingo, 16 de dezembro de 2012

Direito à Cidade e à Cidadania X Cidade Mercadoria

Neste terceiro mandato de vereadora que chega ao final, enfrentamos a realização agressiva do modelo que já chegara em Porto Alegre nas primeiras medidas do primeiro governo Fogaça, do fenômeno chamado gentrificação ou instalação do modelo cidades-empresas americano – embalado agora pelo grande negócio “Copa do Mundo”.

Trata-se do “aburguesamento” de áreas das grandes metrópoles que são tradicionalmente ocupadas pelos pobres, com a consequente expulsão dessas populações mais carentes, resultando na valorização imobiliária desses espaços.
           
Vamos enxergar este processo nas concessões de áreas públicas à exploração privada, como o Araújo Vianna, os quilômetros do Cais do Porto, o do terminal Rui Barbosa que já confinou ali os camelôs proibidos de estarem nas ruas do centro da cidade – dando lugar a automóveis e negócios, na adoção privada e tentativa de cerca-mento das praças e parques; na proibição das carroças de circularem nas áreas nobres, a proibição da Feira da Economia Solidária ou a Feira do Artesanato de acontecerem no Largo Glênio Peres, etc. Neste caminho está a tentativa frustrada da venda do Morro Santa Tereza e de construção do Pontal do Estaleiro, onde a organização das comunidades combinada com o Movimento de resistência à privatização da Orla e trabalho de parlamentares de esquerda, constituíram-se em vitórias da resistência ao modelo.

De caráter excludente e privatizador, este processo combina farta distribuição do direito de construir mais nas áreas mais nobres com segregação dos pobres nas áreas mais longínquas, carentes de infraestrutura, de serviços públicos, de acesso à renda.

Um dos resultados é que nossa capital é a 9ª cidade mais violenta do país. Banidos como ratos indesejáveis, eles se organizam para assaltarem as “despensas” fartas, sem pudor, exibidas nas telas de TV que chegam nos mais miseráveis casebres.
           
E milhares destas moradias precárias coexistem com grandes projetos de modernização e de entretenimento financiados por fundos públicos, alavancados pela iniciativa privada. Emblemática disto é a paisagem do entorno do complexo Arena do Grêmio.
           
Associados aos políticos, ao grande capital e aos promotores culturais, os planejadores urbanos, agora planejadores - empreendedores, tornaram-se peças-chave dessa dinâmica - analisa Otília Arantes, in A Cidade do Pensamento Único: Desmanchando Consensos.
           
Assim que muitas leis foram encaminhadas e apreciadas na Câmara de Vereadores e Assembleia Legislativa que promoveram estes incentivos, impermeáveis a qualquer mecanismo de garantia de retorno ao interesse público geral ou mesmo contrapartidas mitigadoras dos impactos urbanos. Estes todos, via de regra, tem ficado para o estado, em nome do “consenso do desenvolvimento”.
           
Combatemos esta imoralidade em todas estas iniciativas, emendamos, mobilizamos, votamos contra, denunciamos no Ministério Público e de Contas.
           
Na presidência da Câmara, baixamos nas comunidades para dar visibilidade a esta opção que abandona cruelmente o atendimento das condições básicas de vida digna, subimos nos ônibus, circulamos nas escolas, movimentamos a cultura popular e a produção local – “contrapondo-se ao culturalismo de mercado” - para criar consciência do processo em curso, para empoderar a cidadania, apoiar a resistência.
           
Apesar de todo este combate, empresto as palavras de David Harvey (geógrafo britânico, com foco na problemática urbana), para afirmar que também aqui “uma nova e radical elite financeira toma conta da cidade liderando uma coalizão pró-crescimento que habilmente manipula o apoio público e combina fundos públicos e privados para promover uma urbanização comercial em larga escala”.
           
Os beneficiados e interessados nesta política financiaram larga e generosamente seus representantes na disputa eleitoral e obtiveram vantajosa vitória na combinação disto com o “consenso” criado em torno do crescimento a qualquer preço pela aliança entre os gestores e seu apoio político na Câmara Municipal e Assembleia Legislativa, as incorporadoras, os corretores, banqueiros e os chamados por Harvey de “coadjuvantes igualmente interessados e poderosos”: a mídia, as empresas esportivas, universidades, os políticos, as câmaras de comércio, etc...
           
A reeleição do nosso mandato, no entanto, tem o compromisso de estar na oposição disto, fortalecendo o movimento de reação que se organiza desde os bairros populares à classe média critica que percebe o destino nefasto de uma cidade que não consegue construir paz e sustentabilidade, fruição e fluidez, se continuar sendo um grande negócio a serviço da acumulação de riquezas e privilégios.


Sofia Cavedon (PT-PoA)

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