PROC
Nº 2792/15
PLL
Nº272/15
O presente
Projeto de Lei tem por objetivo instituir normas para que os bares e as cantinas
localizadas nos hospitais e centros de saúde, públicos e privados, do Município
de Porto Alegre, comercializem prioritariamente produtos alimentares e bebidas promotoras de
saúde.
A Constituição Federal de 1988
instituiu uma série de direitos aos cidadãos e cidadãs e incumbiu o poder
público, nas três esferas, de promover políticas públicas para garantir esses
direitos. De acordo com o art. 196 da Constituição Federal, a saúde é “direito de todos e dever do Estado, garantido mediante
políticas sociais e econômicas que visem à redução do risco de doença e de
outros agravos e ao acesso universal e igualitário às ações e serviços para sua
promoção, proteção e recuperação”.
Em decorrência dos direitos positivados,várias
leis infraconstitucionais foram aprovadas, entre elas a Lei Orgânica da
Segurança Alimentar e Nutricional, Lei Nº 11.346, de 15 de setembro de 2006, eo
Código de Defesa do Consumidor, Lei Nº 8.078, de 11 de setembro de 1990. Abaixo destacamos artigos destas
leis,
pois eles fundamentam o Projeto de Lei que ora submetemos à apreciação desta
Casa.
A) Lei Orgânica da
Segurança Alimentar e Nutricional:
Art. 2º A alimentação adequada é
direito fundamental do ser humano, inerente à dignidade da pessoa humana e
indispensável à realização dos direitos consagrados na Constituição Federal,
devendo o poder público adotar as políticas e ações que se façam necessárias
para promover e garantir a segurança alimentar e nutricional da população.
§2ºÉ dever do poder público
respeitar, proteger, promover, prover, informar, monitorar, fiscalizar e
avaliar a realização do direito humano à alimentação adequada, bem como garantir
os mecanismos para sua exigibilidade”.
Art. 4o A
segurança alimentar e nutricional abrange:
III – a promoção da
saúde, da nutrição e da alimentação da população, incluindo-se grupos
populacionais específicos e populações em situação de vulnerabilidade social;
IV – a garantia da
qualidade biológica, sanitária, nutricional e tecnológica dos alimentos, bem
como seu aproveitamento, estimulando práticas alimentares e estilos de vida
saudáveis que respeitem a diversidade étnica e racial e cultural da população;
V – a produção de
conhecimento e o acesso à informação; e
VI – a implementação
de políticas públicas e estratégias sustentáveis e participativas de produção,
comercialização e consumo de alimentos, respeitando-se as múltiplas
características culturais do País.
B) Código de Defesa do Consumidor:
Art. 2° Consumidor é
toda pessoa física ou jurídica que adquire ou utiliza produto ou serviço como
destinatário final.
Art. 4º A Política Nacional das Relações de Consumo tem por
objetivo o atendimento das necessidades dos consumidores, o respeito à sua
dignidade, saúde e segurança, a proteção de seus interesses econômicos, a
melhoria da sua qualidade de vida, bem como a transparência e harmonia das
relações de consumo, atendidos os seguintes princípios: (Redação dada pela Lei nº 9.008, de 21.3.1995)
I
- reconhecimento da vulnerabilidade do consumidor no mercado de consumo;
II
- ação governamental no sentido de proteger efetivamente o consumidor:
c) pela presença do Estado no mercado de consumo;
d) pela garantia dos produtos e serviços com padrões
adequados de qualidade, segurança, durabilidade e desempenho.
Art. 6º São direitos básicos do
consumidor:
I - a proteção da
vida, saúde e segurança contra os riscos provocados por práticas no fornecimento
de produtos e serviços considerados perigosos ou nocivos;
Art. 55. A União, os Estados e o Distrito
Federal, em caráter concorrente e nas suas respectivas áreas de atuação
administrativa, baixarão normas relativas à produção, industrialização,
distribuição e consumo de produtos e serviços.
§ 1° A União, os
Estados, o Distrito Federal e os Municípios fiscalizarão e controlarão a
produção, industrialização, distribuição, a publicidade de produtos e serviços
e o mercado de consumo, no interesse da preservação da vida, da saúde, da
segurança, da informação e do bem-estar do consumidor, baixando as normas que
se fizerem necessárias.
[...]
§ 3° Os órgãos
federais, estaduais, do Distrito Federal e municipais com atribuições para fiscalizar
e controlar o mercado de consumo manterão comissões permanentes para
elaboração, revisão e atualização das normas referidas no § 1°, sendo
obrigatória a participação dos consumidores e fornecedores.
Os
artigos da Constituição Federal e da legislação federal destacados acima não
deixam dúvidas quanto ao dever dos poderes públicos em garantir o direito à
vida, à saúde, à segurança alimentar e nutricional dos consumidores, cidadãos e
cidadãs. Demonstram que a ação governamental deve proteger o consumidor contra
riscos provocados por fornecimento de produtos perigosos ou nocivos, pois o
consumidor é vulnerável perante o mercado de consumo, e estimular práticas alimentares
e estilos de vida saudáveis.
Os
hospitais e centros de saúde são instituições, por excelência, que se destinam
à preservação da vida e da saúde, razão pela qual no seu interior todos os
setores devem estar em sintonia com esta missão. Porém, não é isso que ocorre
muitas vezes, porque os bares e as cantinas ali instalados nem sempre têm a
preocupação de disponibilizar alimentos saudáveis aos usuários que, muitas
vezes, por não poder se ausentar do espaço hospitalar precisam se submeter a
adquirir produtos alimentícios não recomendáveis.
Também
é de se considerar que os usuários dos bares e cantinas hospitalares consomem
alimentos influenciados pela confiança e pela percepção de segurança alimentar e
cuidado com a saúde que supõem existir nos serviços ali prestados.Assim sendo, os
bares e cantinas situadas nas unidades hospitalares, na sua grande maioria, exercem
influência nos usuários em geral e nos seus próprios funcionários, portanto é
imperativo que estes serviços primem pela segurança alimentar.
No entanto, face
às demandas geradas pelo modo de vida urbana, novos estilos de vida são
impostos, em particular nos hábitos alimentares. A indústria e o comércio
trabalham visando atender essas demandas e, especialmente, por meio de
publicidade de produtos, influenciam consideravelmente as escolhas alimentares.
Inúmeros produtos comercializados, de relativo baixo custo, como refrigerantes,
sucos adoçados, biscoitos recheados, etc., têm níveis de açúcares, de gorduras
e de sódio acima do recomendado pela Organização Mundial da Saúde – OMS – e que
estão relacionados à maior ocorrência de doenças crônicas como a obesidade,
hipertensão arterial, diabetes, doenças cardiovasculares e alguns tipos de
cânceres, entre outras. Essas doenças crônicas são responsáveis por 72% das
mortes no Brasil. A OMS já evidenciou que estas doenças, uma vez instaladas,
não são curáveis, mas são altamente
preveníveis pela instituição de uma alimentação saudável, o mais precoce e
continuada na vida. Em vista disso, o consumo de frutas, verduras e legumes, a
redução na ingestão de sal, açúcar e gorduras precisam ser incentivados para
que a alimentação adquira patamares saudáveis.
Assim sendo,
para garantir o direito à saúde é necessário que o Estado promova políticas de
segurança alimentar e nutricional, mas também busque incentivar a população a
uma escolha e consumo saudável, além de fiscalizar a produção e comercialização
de alimentos.
Nesse contexto, merece destaque o
fato do Brasil ser um país com um grande número de obesos, ou seja, um país no
qual grande parte da população se alimenta de forma inadequada. Segundo
pesquisa divulgada pelo Ministério da Saúde quase metade da população
brasileira está acima do peso. Em 2006, eram 42,7% da população e,
em 2014, já eram são 52,5% (dados do Vigitel1 2006 e 2014). Este aumento do percentual de pessoas com
excesso de peso, num curto espaço de tempo é indicativo de que o poder público
precisa, urgentemente, implementar ações que atendam à legislação.
No Rio Grande do Sul, dados do
IBGE (Instituto Brasileiro de Geografia e Estatística), de 2013, indicam que
63% da população gaúcha está acima do peso. Porto Alegre é a capital brasileira com maior
número de indivíduos com excesso de peso, 60,7 % dos homens e 50,7 das mulheres
estão acima da medida ideal, aquela que resulta do Índice de Massa Corporal
(IMC), razão entre o peso e o quadrado da altura. Obesidade estava presente em
23,6% deles.
Sabe-se que sobrepeso e obesidade
se instalam precocemente, sendo detectados até mesmo em bebês. E é exatamente
em crianças de zero a cinco anos, que hábitos alimentares saudáveis precisam
ser estabelecidos. Evidentemente, crianças doentes se tornam mais vulneráveis a
este tipo de alimentos, encontrados atualmente nas cantinas e bares
hospitalares. Os familiares “sentem pena” pelo fato da criança estar doente e
acabam comprando esses alimentos, como uma forma de compensação ou agrado.
Os resultados parciais de um
estudo, que inclui todas as crianças matriculadas em escolas de educação
infantil da rede municipal de ensino de Porto Alegre, realizado por convênio de
cooperação técnica entre a Universidade Federal do Rio Grande do Sul (UFRGS) e
a Secretaria Municipal de Educação de Porto Alegre, que se desenvolve desde 2014
e que já examinou 1.399 crianças de zero a 5 anos, evidenciou que 41% delas
apresentam excesso de peso, sendo que obesidade está presente em 6% delas.
Muito grave também foi o achado
de que 20% de 1.041 crianças, com idades entre 2 e 5 anos, deste mesmo grupo,
já apresentam pressão arterial aumentada e que mais 10% são classificadas como
sendo pré-hipertensas, por terem níveis de pressão arterial limítrofes.
Demonstrou-se também uma associação positiva entre o aumento da pressão
arterial e sobrepeso-obesidade. Outro fator etiopatogênico muito importante é o
aumento exagerado na ingestão de sal, cuja fonte são exatamente esses alimentos
vendidos em cantinas e bares de hospitais (salgadinhos, bolachas recheadas,
empadas, etc).
Merece destaque, ainda, o fato de
que os hospitais situados no município de Porto Alegre atendem não só a sua
população residente, mas, também cidadãos e cidadãs, não só adultos e idosos,
mas também crianças e adolescentes, que vêm do interior, cujos acompanhantes e
até mesmo os próprios pacientes, na sua ampla maioria, precisam recorrer aos
bares e cantinas hospitalares para sua alimentação.
Portanto, estimular, através de
normatização, e fiscalizar o estabelecimento de “cantina hospitalar saudável”
são ações que o poder público deve implementar para garantir os direitos
humanos à saúde, à segurança alimentar e do consumidor, mas principalmente para
influenciar os usuários na escolha e compra de produtos alimentícios.
Entendemos
e consideramos necessário que se estabeleçam garantias concretas para que os
estabelecimentos que comercializam alimentos e bebidas nos hospitais públicos e
privados do Município ofereçam produtos que assegurem ao consumidor garantia de
alimentação saudável, com padrões de qualidade nutricional.
Apresentamos
assim, um conjunto de procedimentos orientadores da ação do poder público para
disciplinar o que deve ser comercializado nestes estabelecimentos.
Destacamos
os cuidados com a não comercialização de bebidas com qualquer teor alcoólico;
alimentos e refrigerantes que contenham em sua composição química nutrientes que
forem comprovadamente prejudiciais à saúde. Lembramos que o açúcar em excesso,
as gorduras “trans” são prejudiciais à saúde, contribuem para causar as doenças
crônicas referidas anteriormente, a grande maioria delas, dependente de
sobrepeso e obesidade.
Ajudar
a mudar hábitos alimentares e prevenir e/ou reduzir sobrepeso e a obesidade, e
a ocorrência destas doenças crônicas dos cidadãos e cidadãs é dever do poder
público e o espaço do hospital deve ser educativo a toda a população que por
ali transita, estimulando hábitos alimentares saudáveis.
Nesse
sentido, o projeto prevê, também, medidas que contribuam para uma “educação
alimentar” nestes estabelecimentos comerciais, tema que nos tempos
contemporâneos se reveste de fundamental importância devido ao sobrepeso da
população e as doenças geradas pela mudança de comportamento alimentar das
últimas décadas cujas consequências são sentidas não só no plano dos próprios
indivíduos, mas influem diretamente no erário público, pois tornam-se problemas
de saúde pública que impactam o Sistema único de Saúde (SUS).
Assim
sendo, este Projeto de Lei propõe que os bares e cantinas situadas nos hospitais
e centros de saúde disponham materiais que estimulem uma alimentação saudável como:
toalhas de bandeja, jogos americanos descartáveis, folhetos, cartazes.
Pela
relevância do tema é que colocamos este Projeto de Lei à apreciação dos nobres
colegas vereadores.
1.
VIGITEL
– Pesquisa sobre fatores de risco e proteção para doenças crônicas, realizada
pelo Ministério da Saúde, anualmente, desde 2006, por telefone, em todas as
capitais do Brasil e no Distrito Federal. Inclui indivíduos com idades igual ou
maior que 18 anos.
VEREADORA
SOFIA CAVEDON
PROJETO DE LEI
Estabelece, no Município de Porto Alegre, normas
para o controle da comercialização de produtos alimentícios e de bebidas nos
bares e cantinas situadas nos hospitais e centros de saúde, públicos e privados,
e dá outras providências.
Art.
1º
Ficam estabelecidas as normas de controle da comercialização de produtos
alimentícios e de bebidas nos bares e cantinas dos hospitais e centros de saúde,
públicos e privados, no Município de Porto Alegre.
Art.
2º
A comercialização de produtos alimentícios e de bebidas nos bares e nas
cantinas dos hospitais e centros de saúde, públicos e privados, no Município de
Porto Alegre considerará:
I - a garantia do Direito Humano à
Alimentação Adequada (DHAA);
II
– a produção
de alimentos seguros como prática necessária e direito do consumidor;
III - a
confiança depositada pelos usuários no serviço prestado dentro de uma
instituição hospitalar, em termos de higiene e segurança alimentar;
IV – a
responsabilidade governamental no sentido de proteger o consumidor.
Art.
3º
No oferecimento de alimentos e bebidas nos bares e cantinas dos hospitais e
centros de saúde, públicos e privados, deve constar itens e refeições
equilibradas e balanceadas, com nutrientes necessários à saúde, com controle de
açúcar, sal e gordura, priorizando frutas, verduras e cereais integrais;
Art.
4º
Os bares e cantinas dos hospitais e centros de saúde, públicos e privados, oferecerão,
em maior evidência que os demais alimentos, frutas (in natura, batidas, vitaminas, saladas de fruta), sanduíches
naturais, cereais, bebidas lácteas, sucos com
frutas naturais e sem adição de açúcar, saladas naturais com qualidade
nutricional, todos devidamente acondicionados, prontos para o consumo.
Art.5ºOs bares e
cantinas dos hospitais e centros de saúde, públicos e privados, não poderão
comercializar os seguintes produtos:
I – bebidas com
qualquer teor alcoólico;
II – alimentos e
bebidas que contenham, em sua composição química, nutrientes que sejam
comprovadamente prejudiciais à saúde; e
III – alimentos
e produtos cujos componentes possam causar dependência física ou psíquica,
ainda que por utilização indevida.
Art.
6º
Fica vedada a exposição de cartazes publicitários que estimulem a aquisição e o
consumo de balas, chicletes, salgadinhos, refrigerantes,
sorvetes e assemelhados nos bares e cantinas dos hospitais e centros de saúde,
públicos e privados, situados no Município de Porto Alegre.
Art.7º Os bares e cantinas dos hospitais e
centros de saúde, públicos e privados, devem dispor de materiais que estimulem
uma alimentação saudável como: toalhas de bandeja, jogos americanos
descartáveis, folhetos, cartazes.
Art.
8º
O Executivo Municipal, por meio dos órgãos competentes, fará incluir as
exigências desta Lei nos alvarás sanitários, expedidos pela Equipe de
Vigilância em Saúde, nos alvarás de Licença para Atividades Localizadas,
expedidos pela Secretaria Municipal da Produção, Indústria e Comércio (SMIC) e
nos editais de licitação para eventuais instalações desses estabelecimentos nos
hospitais e centros de saúde públicos.
Art.
9º
Somente poderão comercializar alimentos e bebidas, nos bares e cantinas dos
hospitais e centros de saúde, públicos e privados, no Município de Porto
Alegre, os estabelecimentos que obtiverem Alvará Sanitário, expedido pela
Equipe de Vigilância em Saúde (SMS), e o Alvará de Licença para atividades
Localizadas, expedido pela SMIC.
Art.
10
O Executivo Municipal, por meio do órgão competente, deverá promover campanha
de divulgação, visando à educação para o consumo adequado dos produtos
oferecidos nos bares e cantinas que atuem nos hospitais e centros de saúde,
públicos e privados, no Município de Porto Alegre e o teor dessa lei.
Art.
11
Os bares e cantinas dos hospitais e centros de saúde situados no Município de
Porto Alegre, deverão adequar-se às exigências estabelecidas nesta Lei, em prazo
a ser estabelecido pelo Executivo Municipal.
Art.
12
Compete ao Executivo Municipal a fiscalização das exigências estabelecidas nesta
Lei, por meio do órgão competente.
Art.
13
Esta Lei entre em vigor na data de sua publicação.
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