PROC. Nº 6683/05 - PLCL Nº 044/05 -
EXPOSIÇÃO DE MOTIVOS
O presente projeto visa regulamentar o inventário, instrumento de proteção de patrimônio cultural previsto na ordem constitucional brasileira, desde a Constituição Federal de 1988, na Estadual de 1989, e na Lei Orgânica do Município de Porto Alegre.
Com efeito, parágrafo primeiro do artigo art. 216 da Constituição Federal
estabelece que, para a proteção do patrimônio, o Poder Público utilizará instrumentos como inventário, registros, vigilância, tombamento e desapropriação, além de outras formas de acautelamento e preservação.
A Constituição do Estado, seguindo o espírito da Constituição Federal, ressalta a importância da preservação e da proteção da cultura. É o que se verifica nos artigos 220 a 224. E mais, identifica o acesso ao patrimônio cultural como direito cultural a ser garantido pelo Estado, entendido este como o patrimônio natural, e os bens de natureza material e imaterial portadores de referência à identidade, à memória dos grupos formadores da sociedade sul-rio-grandense cultural, tais como formas de expressão, modos de fazer, criar e viver, criações artísticas, científicas e tecnológicas, obras, objetos, monumentos, documentos edificações, espaços reservados a manifestações, conjuntos urbanos e sítios de valor histórico, paisagístico, artístico, arqueológico, científico e ecológico (art. 221, inciso V).
O instrumento do inventário é previsto no artigo 222, que determina a proteção do patrimônio cultural como tarefa do Estado e da comunidade, citando como instrumentos os mesmos já identificados no artigo 216 da Carta Federal (inventário, o registro, a vigilância, o tombamento, a desapropriação, outras formas de acautelamento e preservação). O parágrafo primeiro deste artigo sinaliza com incentivos para a preservação e conservação aos proprietários, incentivos estes a serem definidos em lei; o parágrafo segundo salienta a punição aos danos e ameaças ao patrimônio protegido.
Com o advento da Lei Orgânica de 1990, o patrimônio cultural recebeu
tratamento especial em Porto Alegre, estabelecendo: a) a preservação dos bens e locais de valor histórico, cultural, ou científico (art. 9 º, inciso X); b) o dever de proteger o patrimônio cultural e histórico por meio de inventários, registros, vigilância, tombamento, desapropriações e etc. (art. 196). E afirmou, a Lei Orgânica, no artigo 204, a vinculação da função social da propriedade à preservação ambiental, natural e histórico-cultural.
Por sua vez, o Plano Diretor de Porto Alegre – PDDUA, aprovado pela Lei
Complementar nº 434/99, prevê, no art. 14, que as edificações inventariadas e tombadas compreendem o patrimônio cultural do Município, estabelecendo a necessidade de sua regulamentação mediante lei específica. É o que dispõe o § 5º do art.92. A aplicação deste dispositivo Constitucional, no âmbito municipal, demonstrou a necessidade de se proceder o detalhamento dos instrumentos, em especial do Inventário, o qual, em face de ausência de lei federal, tem sua eficácia limitada, eis que não apresenta um conceito definido em lei, nem tampouco são estabelecidos os efeitos, obrigações e procedimentos a serem adotados para a respectiva inscrição dos bens.
Como já mencionado, alguns dispositivos, porém, foram inseridos no Plano
Diretor. O artigo 14, antes citado, estabelece a classificação dos bens inventariados:
“ I – de estruturação é aquela que por seus valores atribui identidade ao
espaço, constituindo elemento significativo na estruturação da paisagem onde se localiza;
II – de Compatibilização é aquela que expressa relação significativa com a
de estruturação e seu entorno, cuja volumetria e outros elementos de composição requerem tratamento especial.”
O Plano Diretor ainda declara de isentos de Índice de Aproveitamento as
edificações inventariadas de estruturação, no art. 107. Prevê ainda penalidades a serem aplicadas, quando os bens inventariados não forem preservados. É o caso da limitação da capacidade construtiva do imóvel à área do prédio inventariado de Estruturação, nos termos do artigo 87, inciso V.
A necessidade de detalhamento na regulamentação do instituto é evidente.
É necessário o estabelecimento de um procedimento adequado, dos efeitos e obrigações dela decorrentes, bem como a previsão de normas que incentivem a preservação, como a transferência de potencial construtivo, prevista no projeto que ora se encaminha. Este dispositivo viabiliza que o proprietário obtenha recursos financeiros para as obras de restauração e manutenção. A ausência de previsão de instrumentos que de qualquer forma contribuam para a preservação faz com que, paulatinamente, a cidade venha a perder o seu patrimônio.
O procedimento previsto no projeto garante o direito de manifestação ao
proprietário, sendo estabelecido prazo para a apresentação de defesa, ouvido o Conselho competente, o Conselho do Patrimônio Histórico Cultural – COMPAHC.
Trata-se de um instrumento importante, já utilizado há muitos anos em Porto Alegre, desde a listagem dos imóveis de interesse cultural prevista no Plano Diretor de 79. Mesmo sem a regulamentação, este instrumento já vem cumprindo importante papel na preservação das características ambientais e culturais de nossa cidade.
Urge a regulamentação que alcance ao Executivo e aos cidadãos mecanismos que tornem transparentes os critérios, prazos, responsabilidades e benefícios deste importante instrumento.
Com esta providência, a Câmara Municipal fará com que mais uma vez Porto Alegre seja vanguarda na preservação do patrimônio cultural, eis que será a primeira Capital a legislar sobre a matéria.
Sala das Sessões, 10 de novembro de 2005.
VEREADORA SOFIA CAVEDON e VEREADORA MARGARETE MORAES
PROJETO DE LEI COMPLEMENTAR
Dispõe sobre o Inventário do Patrimônio Cultural de Bens Imóveis do Município.
Art. 1º Esta Lei Complementar dispõe sobre o Inventário do Patrimônio
Cultural de Bens Imóveis do Município, nos termos do art. 196 da Lei Orgânica do Município de Porto Alegre e do art. 92 da Lei Complementar nº 434, de 1º de dezembro de 1999, e alterações posteriores (PDDUA).
Art. 2º O Inventário do Patrimônio Cultural de Bens Imóveis do Município,
estabelecido nesta Lei Complementar, será implantado por meio da listagem dos bens, com a indicação das características necessárias à sua identificação.
§ 1º A inclusão de bens no Inventário do Patrimônio Cultural será instruída
com todos os elementos que fundamentam a sua proteção e será precedida de avaliação de órgão técnico e submetida ao Conselho Municipal do Patrimônio Histórico e Cultural (COMPAHC), nos termos de regulamentação do Poder Executivo.
§ 2º O Inventário do Patrimônio Cultural indicará as edificações inventariadas de estruturação e de compatibilização, nos termos do art. 14 da Lei Complementar n° 434, de 1999, e alterações posteriores, observando que:
I. de estruturação é aquela que por seus valores atribui identidade ao espaço, constituindo elemento significativo na estruturação da paisagem onde se localiza;
II. de compatibilização é aquela que expressa relação significativa com a
de estruturação e seu entorno, cuja volumetria e outros elementos de
composição requerem tratamento especial.
Art. 3º Será dada ciência de inclusão de imóveis no Inventário do Patrimônio Cultural ao Poder Legislativo no prazo de 180 (cento e oitenta) dias a partir da homologação do Prefeito.
Art. 4° Durante os levantamentos necessários à inclusão dos bens no Inventário do Patrimônio Cultural não será expedida Declaração Municipal Informativa das Condições Urbanísticas do Imóvel (DM), licença de demolição ou aprovação de projeto para os imóveis situados nos limites da área em estudo, sem a prévia avaliação pela Equipe de Patrimônio Histórico e Cultural da Secretaria Municipal de Cultura (EPAHC/SMC), referente ao respectivo interesse na preservação.
Art. 5º A partir da inclusão de bens imóveis no Inventário do Patrimônio
Cultural, a capacidade construtiva de bens imóveis fica limitada a 50% (cinqüenta por cento) da definida na Lei Complementar nº 434, de 1999, e alterações posteriores.
Parágrafo único. Nos imóveis inventariados fica vedada a aplicação de potencial construtivo decorrente de Solo Criado ou de Transferência de Potencial Construtivo.
Art. 6º O processo de registros dos bens imóveis se dará nos termos definidos nesta Lei, mediante procedimento administrativo, resguardando-se o contraditório.
Art. 7º Os bens imóveis de propriedade do Poder Público Municipal serão
listados e incorporados ao inventário, nos termos da manifestação do Conselho Municipal do Patrimônio Histórico e Cultural (COMPAHC), e os bens de propriedade privada serão incorporados ao inventário, após notificação e conclusão do processo administrativo que indique a inclusão do bem ao Patrimônio Cultural.
§ 1º Após a notificação estabelecida no caput, o proprietário ou seu representante legal terá o prazo de 15 (quinze) dias para apresentação de impugnação.
§ 2º A impugnação será examinada pelo órgão técnico competente, em prazo a ser fixado em decreto do Poder Executivo, cujo parecer será submetido ao COMPAHC.
§ 3º Após manifestação do COMPAHC pela inclusão do imóvel ao Inventário, ao proprietário será dada ciência da inclusão de seu imóvel ao inventário e das medidas que devem ser tomadas relativamente à manutenção e conservação do imóvel.
Art. 8º A lista dos imóveis com inclusão no inventário, já aprovada pelo
COMPAHC e homologada pelo Prefeito até a data da publicação desta Lei Complementar, será publicada no Diário Oficial de Porto Alegre, aplicando-se o prazo para contestação previsto no art. 6º desta Lei Complementar.
Art. 9º A inclusão de bens no Inventário do Patrimônio Cultural poderá
ser cancelada com base em parecer fundamentado do Conselho competente, homologado pelo Prefeito.
Parágrafo único. A degradação física do bem inventariado de estruturação não poderá ser alegada pelo proprietário como fundamentação para justificar seu cancelamento na listagem do Inventário.
Art. 10. Os bens inventariados de estruturação não podem ser destruídos,
mutilados ou demolidos, sendo dever do proprietário a sua preservação e conservação.
Parágrafo único. Poderá ser autorizada, mediante estudo prévio junto ao órgão técnico competente, a demolição parcial, a reciclagem de uso ou o acréscimo de área construída, desde que se mantenham preservados os elementos históricos e culturais que determinaram a sua inclusão no Inventário do Patrimônio Cultural.
Art. 11. Os bens inventariados de compatibilização poderão ser demolidos,
devendo a edificação que o substituir observar as restrições necessárias à preservação cultural e histórica do imóvel de estruturação e de entorno a que estiver vinculado, bem como à paisagem urbana.
Art. 12. Para os bens inventariados de estruturação, a aplicação da legislação referente à acessibilidade e proteção contra incêndio deverá estar devidamente compatibilizada com as características arquitetônicas, históricas e culturais do imóvel.
Art. 13. O licenciamento de anúncios, publicidades e divulgações, as instalações de equipamento de infra-estrutura aparente no mobiliário urbano e autorizações de comércio ambulante em bens inventariados de estruturação e no seu entorno deverão observar a preservação das características arquitetônicas, históricas e culturais da edificação e do entorno, além do potencial turístico, evitando-se a poluição visual e paisagística.
Art. 14. O Poder Público poderá inspecionar os bens inventariados sempre
que julgar necessário e, obrigatoriamente, diante de denúncia de desrespeito à preservação do bem inventariado, não podendo o proprietário, detentor ou possuidor impedir a inspeção.
Art. 15. Na restauração ou preservação das edificações inventariadas de estruturação, a critério do órgão municipal competente, poderá ser autorizada a transferência de parte do potencial construtivo do imóvel para outro imóvel situado na mesma Macrozona, quando não houver possibilidade ou interesse ambiental de utilização no mesmo imóvel do bem inventariado, observado o disposto nos arts. 4º e 5° desta Lei Complementar.
§ 1° A liberação da Transferência de Potencial Construtivo deverá ser parcelada, observando as etapas de acordo com cronograma físico-financeiro das obras de restauração, salvo na hipótese do imóvel se encontrar nas condições adequadas de preservação caso no qual a transferência poderá se dar em única parcela.
§ 2º A utilização do potencial construtivo decorrente de Transferência do
Potencial Construtivo é condicionada à comprovação da sua averbação na matrícula do imóvel originário junto ao Registro Imobiliário.
§ 3° No caso de descumprimento do prazo estabelecido para a conclusão
das obras de restauração do bem inventariado de estruturação, será determinada a devolução do valor correspondente a 100% (cem por cento) do potencial construtivo do imóvel, observada a avaliação dos índices do Solo Criado.
Art. 16. Constatado descumprimento de quaisquer das disposições previstas nesta Lei Complementar, será notificado o proprietário, possuidor ou detentor do imóvel, facultando-lhe apresentar defesa no prazo de 15 (quinze) dias.
Parágrafo único. Os valores correspondentes ao cumprimento das penalidades decorrentes da aplicação desta Lei Complementar serão depositados no Fundo Municipal do Patrimônio Histórico e Cultural.
Art. 17. A mutilação, destruição parcial ou demolição do bem inventariado
sem a licença do Município, ou se autorizada em desacordo com as orientações do Município, enseja a aplicação de multa no valor de 14 a 1.100 CUBs (quatorze a mil e cem Custos Unitários Básicos), observado o dano causado.
Parágrafo único. No caso de mutilação destruição ou demolição, o proprietário, às suas expensas, realizará o salvamento arqueológico do terreno, com licença do Instituto do Patrimônio Histórico e Artístico Nacional e sob orientação e no prazo estabelecido pelo Município.
Art. 18. Constatado o descumprimento das determinações de manutenção e conservação do bem inventariado, será o proprietário ou responsável notificado para que, no prazo de 90 (noventa) dias, tome as providências necessárias.
§ 1º O descumprimento do prazo referido no caput deste artigo implica auto de infração com multa diária de 100 UFMs (cem Unidades Financeiras Municipais), até o efetivo cumprimento das disposições do auto de infração, comprovado em vistoria realizada pelo órgão municipal competente.
§ 2º O descumprimento das determinações de manutenção e conservação
do bem restaurado com recursos decorrentes de Transferência de Potencial Construtivo implica multa diária de 100 (cem) UFMs, contada a partir da elaboração do auto de infração até o efetivo cumprimento, comprovado em vistoria realizada pelo órgão municipal competente.
Art. 19. A execução de obra sem prévio licenciamento será imediatamente
embargada, e ao infrator, proprietário, possuidor ou detentor será aplicada multa de 1600 a 8500 (mil e seiscentas a oito mil e quinhentas) UFMs.
Art. 20. Na aplicação das penalidades previstas nos arts. 17 e 19 desta Lei
Complementar, a graduação observará a gravidade do dano e eventual reincidência do proprietário do imóvel na postura infratora, observado o disposto nos parágrafos deste artigo.
§ 1° Constitui reincidência a prática de nova infração contra a preservação
ambiental ou contra o patrimônio cultural no prazo de cinco anos.
§ 2° A multa aplicada no caso de reincidência poderá ter seu valor calculado através da majoração de até o dobro das penas máximas previstas nesta Lei
Complementar.
Art. 21. Esta Lei Complementar entra em vigor na data de sua publicação.
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